Burocracia: veneno ou remédio?
*Marcos Morita
Você sente calafrios, tremores, raiva, arrepios, fobia ou
pânico quando escuta ou pronuncia a palavra burocracia? Creio que todo
brasileiro tenha no mínimo uma experiência negativa para contar, entre filas, atestados,
procurações, carimbos, reconhecimentos de firmas, desmandos, descasos, abusos
de poder, idas e vindas a cartórios e repartições. Um emaranhado de processos,
procedimentos e requerimentos sem sentido, atrasando, engessando e atravancando
a vida de pessoas físicas e jurídicas.
Imagine a dificuldade para explicar a um norueguês, alemão
ou japonês os motivos de tanta demora para renovar seu visto de permanência,
abrir uma empresa, conseguir uma licença ou alvará de funcionamento ou pior
ainda, os caminhos alternativos para acelerá-los, utilizando-se de
despachantes, contatos, influenciadores e suas mágicas propinas?
Não obstante as críticas, a teoria da burocracia criada pelo
filósofo alemão Max Weber, em meados de 1940, tinha como objetivo a busca pela
racionalização e a eficiência nas crescentes organizações que floresciam na
época. Para Weber, a burocracia baseava-se na formulação de procedimentos e
processos escritos, os quais obedeciam a fluxos preestabelecidos e hierarquias
rígidas, através de uma definição de cargos prévios, onde cada pessoa sabia
exatamente o papel a desempenhar.
Talvez venham da formulação teórica os malefícios e
desvantagens da burocracia, tais como a rigidez em seguir as regras e
procedimentos a risca, a inflexibilidade em abrir concessões, a não utilização
do bom senso para resolver problemas que fujam da rotina ou saiam do raio de
atuação, assim como o descaso aos clientes, uma vez que a burocracia
despersonaliza a relação, focando-se no cargo e na hierarquia.
Com a crescente concorrência e a globalização do final do
século, as empresas viraram do avesso em busca de produtividade e agilidade.
Michael Hammer surgiu como guru da época com sua teoria denominada
“reengenharia” cujo mote principal era o fim da burocracia, cortando níveis
hierárquicos de maneira indiscriminada (downsizing), reduzindo, eliminando e
reestruturando processos e estruturas.
Que tal uma organização perfeita, sem processos,
procedimentos, hierarquia, papéis, controles e registros, os quais tanto
dificultam nossa vida? Apesar do foco no cliente e a boa vontade, seria
praticamente impossível ou inviável atender a todas as solicitações com
qualidade e eficiência. Desnecessário seria comentar as fraudes e desvios, que
em casos passados levaram à criação de leis especificas, como a Sarbanes-Oxley
e comitês de governança corporativa. Isso já mandou muita gente graúda para a
cadeia, como no caso americano Enron.
Apesar da dissonância, a burocracia pode ser positiva quando
bem dosada e aplicada de maneira correta, trazendo rapidez e transparência,
além de registros confiáveis e padronização, garantindo qualidade e eficiência
às organizações e seu ecossistema. Em suma, o que diferencia a burocracia boa
da ruim é o excesso e a orientação ao cliente ou ao próprio umbigo.
Infelizmente neste quesito vivemos o pior dos mundos:
excesso de burocracia e total descaso ao cidadão por um lado, e fraudes,
desvios e descalabros por outro. Isso contribui para a criação de mais leis e
procedimentos, engessando ainda mais a pesada máquina do estado e
retroalimentando o monstro da burocracia. Como já dizia o ditado: a diferença
entre um remédio e um veneno está só na dosagem. Enfim, o Ministério da Saúde
adverte: burocracia demais faz mal a saúde!
*Marcos Morita é
executivo, professor, palestrante e consultor. Sua palestra, As 4 Chaves do
Pensamento Estratégico, vista por centenas de executivos, aborda de maneira
lúdica e participativa, temas como definição de metas, inovação, gerenciamento
do tempo e motivação.
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