Questão de sobrevivência
* Caio Portugal
Os loteamentos continuam a ter boa receptividade dos
consumidores, basicamente, por dois fatores: Os lotes urbanizados não são
financiados pelo SFH (Sistema Financeiro de Habitação) e acabam sendo
comercializados diretamente pelos incorporadores de lotes. Esse diferencial, se
é que podemos chamar assim, permite aos compradores uma menor influência da
restrição de crédito e da elevação das taxas juros.
Mesmo em meio à crise macroeconômica do País e da queda da
confiança por causa da inflação e do baixo crescimento, a demanda por lotes
urbanizados permanece aquecida. Além disso, a melhoria na qualidade dos
projetos tem atraído os olhares de consumidores atentos às boas oportunidades
de mercado.
Por não depender de crédito imobiliário, o mercado de
loteamentos, abertos ou com controle de acesso, difere-se do segmento de
incorporação de unidades construídas. Esse descolamento entre ambos faz com que
haja diferenças consideráveis em volume de lançamentos.
Outra peculiaridade do setor de loteamentos é o seu longo
ciclo de produção. Pode-se chegar a 24 meses para aprovar um projeto - obtenção
de licenças ambientais, aprovações municipais e registro de imóveis. Portanto,
o segmento sofre menor influência da volatilidade dos dados macroeconômicos,
sejam eles extremamente favoráveis ou negativos. Além disso, o lote urbanizado
é visto como reserva de valor e atrai investidores, além daqueles que compram
para construir a casa própria.
O lote urbanizado é um bom investimento por vários motivos.
Os encargos desse ativo, por exemplo, não geram ônus muito elevados, pois
normalmente resumem-se em IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e,
eventualmente, em taxas associativas, quando for loteamento com controle de
acesso. E na medida em que os lotes são edificados, a lei de oferta e procura
faz com que os preços evoluam, em alguns casos, de maneira superior a outras
aplicações financeiras. Contudo, ao aplicar em lote como ativo financeiro
deve-se ter atenção à sua liquidez, pois, como qualquer outro tipo de imóvel, a
venda não é imediata e depende do comportamento do mercado local, além do humor
da economia interna do País.
De qualquer forma, é importante o consumidor conhecer bem o
mercado, a idoneidade das empresas que estão desenvolvendo os empreendimentos,
e se as cidades onde estão os lotes têm economia diversificada e bom
crescimento.
Ressalto, porém, que esse panorama traçado até agora não
significa que o setor não enfrente nenhum entrave. Os loteadores têm de cumprir
marcos regulatórios complexos, suportar a interferência de órgãos municipais e
estaduais e, quase sempre, assumir responsabilidades do poder público, como
suprir a falta de investimentos das concessionárias de saneamento. Além de
atender à obrigatoriedade de instalar toda a infraestrutura interna do lote
para garantir o abastecimento de água potável e o tratamento de esgoto, o
loteador tem de assumir a instalação de sistemas de adução e tratamento de
água.
Outro grande obstáculo é a falta de linhas de financiamento
de crédito imobiliário para produção e comercialização dos lotes. Por mais
paradoxal que possa parecer, os recursos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço) e do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) para financiar
habitação não podem ser destinados à produção de terra urbanizada. O
trabalhador não pode usar o dinheiro do Fundo para amortizar a dívida, ou parte
dela, da compra de um lote. Quando consegue acessar os recursos da poupança, os
bancos financiam parte do preço, normalmente 50%, com taxas de juros e encargos
caros e que impedem o acesso da grande massa de compradores desse tipo de
produto imobiliário.
Na prática, as empresas de loteamento financiam o consumidor
com prazos superiores a oito anos (100 meses). Assim, o setor desvirtua seu
papel fundamental de ofertar terra urbanizada. E a adoção desse comportamento
pelos empresários é por absoluta necessidade de sobrevivência!
*Caio Portugal é
presidente da Aelo (Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento
Urbano) e vice-presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do
Secovi-SP
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