Menoridade penal: por que não ousamos
pensar?
Ousar pensar, Sapere aude, dizia Kant! Imagine uma empresa,
em estado pré-falencial, com capacidade de produção baixíssima, que só está
conseguindo atender 8% da demanda. A empresa não está com problema de demanda,
sim, de oferta (do seu produto). Se crescer a demanda, é evidente que a
aumentará a ineficiência da empresa (que já funciona precariamente). O que
fazer para salvar essa empresa? Claro que, nesse caso, devemos incrementar a
oferta.
Em lugar de estimular a oferta (de segurança), a redução da
maioridade penal (de 18 para 16 anos) vai aumentar a demanda por mais direito
penal. A estrutura (falida) do Estado (policial, judicial e carcerária), que
não conta com capacidade para atender a demanda atual (apenas 8% dos homicídios
são investigados no Brasil), vai se estrangular mais ainda e gerará mais
ineficiência da resposta penal (com a consequente descrença no funcionamento da
Justiça). Onde falta a certeza do castigo é uma tolice esperar que o incremento
da demanda resolva o problema da insegurança pública.
Não é a maioridade que deve ser mudada, sim, o ECA (para
prever tempo de internação mais longo em caso de assassinatos: menores
assassinos devem ficar mais tempo recolhidos; é uma questão de proporcionalidade).
No mais, o que vem dando certo no mundo todo não é a edição de novas leis
penais (no Brasil estamos fazendo isso desde 1940 e agora já estamos com 29
assassinatos para 100 mil pessoas), sim (1º) a prevenção primária (que
significa melhorar as condições socioeconômicas da população): nos países
escandinavos há 1 assassinato para cada 100 mil pessoas (são países altamente
civilizados de capitalismo distributivo: excelente escolaridade, alta renda per
capita e baixa desigualdade, com forte índice de certeza do castigo); (2º) a
prevenção secundária nos EUA (obstáculos ao crime: mais policiais, saneamento
das polícias - exclusão dos corruptos, bons salários e boas condições para se
trabalhar -, policiamento massivo nas "nas zonas quentes", blitz
generalizada e contínua, alto índice de certeza do castigo etc.) - dessa forma
a criminalidade baixo 50% nos últimos 20 anos.
Outro empreendimento de sucesso foi o que apostou na
prevenção via escolarização massiva em período integral + alto índice de
certeza do castigo (Coreia do Sul, Cingapura, Japão, Canadá, Alemanha etc.
Contam com menos de 2 assassinatos para cada 100 mil pessoas); não se pode
deixar de mencionar também a prevenção moral e ética (ética que ensina o
respeito ao outro ser humano - é o caso dos países que seguem doutrinas
filosóficas, como a de Confúcio, no Oriente; eles seguem o princípio ético da
ahimsa, que significa não ferir, não maltratar, não ofender, não matar - salvo
em situações de extrema necessidade). Nesses países os homicídios não chegam a
2 por 100 mil.
O mundo todo está encontrando saídas racionais para os seus
problemas. Por que teimamos no Brasil em seguir na contramão da história? Sem
educação de qualidade para todos (em período integral, o que significa recolher
todos os menores do país nas escolas, proibindo-os nas ruas, se
desacompanhados) + programas preventivos bem executados + alto índice de
certeza do castigo (eficiência da polícia e da Justiça) nunca sairemos do
atoleiro da violência. Medidas ilusórias e paliativas aumentarão a
criminalidade (porque incrementam a demanda em lugar de resolver o problema da
oferta de segurança).
*Luiz Flávio Gomes é Jurista, Professor e presidente do
Instituto Avante Brasil
**Confira todos os artigos do professor Luiz Flávio Gomes
no: www.luizflaviogomes.com
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