A glória da burrice
*José Pio Martins
Inconformado com a estupidez do governo e dos políticos dos
anos 50 e 60, que batiam no peito e gritavam que nunca iriam autorizar empresas
multinacionais a produzirem petróleo no Brasil, Roberto Campos desabafou
dizendo que “a burrice no Brasil tem um passado glorioso e um futuro
promissor”. A angústia do grande economista era que, enquanto rejeitava capitais
de risco dispostos a investir na produção de petróleo aqui, o governo sofria em
busca de empréstimos (a juros altos) para fazer importações do produto.
Roberto Campos não entendia a lógica que o governo e os
políticos viam na ideia de que mendigar empréstimos internacionais e ficar na
dependência de suprimento externo era melhor que atrair empresas estrangeiras
para a produção em território nacional. Quando veio a crise do petróleo, em
1973, e o preço do barril pulou de US$ 3,20 para US$ 14, o Brasil importava 75%
do consumo, a dívida externa explodiu e o país quebrou. A frase de Roberto
Campos foi profética. A burrice provou sua glória passada como, após a morte do
autor, em 9 de outubro de 2001, continuou firme rumo ao futuro promissor.
Exemplo soberbo da burrice nacional são os entraves à
participação na globalização. Levantamento da Câmara de Comércio Mundial
informa que o Brasil continua sendo o país mais fechado para o comércio
exterior entre todas as nações do G20, ficando com nota 2,3 em 2015 (a escala
vai de 1 a 6), atrás de Argentina e Índia. Para piorar, o país caiu da 57ª para
a 75ª posição, entre 140 países, no ranking da competitividade global publicado
pelo Fórum Econômico Global – perdendo, assim, 18 posições.
Mas o que é essa tal globalização? Para começar, é uma
necessidade, em face da superpopulação. O planeta atingiu 1 bilhão de
habitantes somente em 1830. Em apenas 100 anos, a população dobrou. Hoje, já
somos 7,3 bilhões. A globalização é a possibilidade de um habitante de Berlim
comer um mamão produzido em Manaus, um morador de Maringá poder comer trigo
produzido na França ou uma maçã da Argentina, um doente na China poder curar-se
com um medicamento feito na Bélgica, ou um esquerdista francês poder escrever
contra a globalização em seu notebook coreano.
As necessidades humanas estão onde as pessoas estão; as
condições adequadas à produção, não. O Brasil tem terra fértil e clima
favorável à soja, mas não tem para o trigo. Certos países têm petróleo, mas não
têm comida. Quanto mais os países se especializarem naquilo em que são mais
produtivos e eficientes, melhores serão as chances de elevação do bem-estar via
comércio exterior. Ademais, ao comércio seguem-se os investimentos e, a estes,
segue-se a transferência de tecnologia. O nacionalismo protecionista condena o
país ao isolamento e ao atraso. Nenhum país do mundo – nem mesmo os Estados
Unidos – consegue gerar toda a tecnologia requerida para seu crescimento.
Quando proibiu a importação de computadores, componentes
eletrônicos e tecnologia, e também proibiu empresários estrangeiros de
investirem em empresas de informática em nosso território, a lei de reserva de
mercado de informática (que durou até 1991) cometeu grave crime econômico
contra o povo brasileiro. Mas os nacionalistas – de direita (inclusive alguns
militares) e de esquerda – reivindicavam medalhas de defensores da pátria.
Lamentável!
Apesar da repetição do fracasso desse tipo de nacionalismo,
continuamos insistindo na mesma rota. Definitivamente, a burrice no Brasil tem
garantido um futuro promissor.
*José Pio Martins,
economista, é reitor da Universidade Positivo
**Central Press
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