Aumento de impostos é a
pior alternativa para o ajuste fiscal
Estudo do FMI mostra
que ajuste fiscal de países desenvolvidos deu-se pelo corte de despesas e não
pelo aumento de impostos
*João Guilherme
Sabino Ometto
Desde o biênio 1930/1931 o PIB brasileiro não se retraía por
dois anos seguidos, como deverá ocorrer em 2015 e 2016. A base de todo o
desajuste econômico, incluindo o crescente desemprego, a inflação chegando a
dois dígitos, o retrocesso da produção industrial ao patamar de 2009 e a
baixíssima confiança dos consumidores e empresários, está no descontrole das
contas públicas. No período 2012/14, o Governo Federal expandiu suas despesas e
abriu mão de receitas. Além disso, existe a pressão no crescimento dos gastos
obrigatórios, como aposentadorias e salário do funcionalismo.
Com mais gastos e menos recursos, o resultado fiscal
primário caiu ano após ano. Em 2014, o setor público (União, estados e
municípios) apresentou déficit primário de 0,6% do PIB, algo jamais observado
desde que a série passou a ser calculada pelo Banco Central, em 2001. Há,
ainda, a contabilidade criativa (“pedaladas”) do Governo Federal, que adiava
pagamentos e maquiava a real condição das contas públicas. Como resultado, a
dívida bruta do Estado em geral apresentou o avanço expressivo de 12,8 pontos
percentuais em menos de 24 meses, atingindo os atuais 66,1% do PIB.
A expansão do endividamento e a previsão de que seguirá
aumentando nos próximos anos, caso nada seja feito, colocam em cheque a
sustentabilidade fiscal do governo, isto é, a capacidade de ele honrar seus
compromissos. Diante de todo esse quadro, evidencia-se o quão essencial é o
ajuste das contas públicas para se quebrar o círculo vicioso de recessão,
inflação e desemprego e retomar o crescimento econômico.
Interessante estudo do FMI analisa os efeitos no curto e
longo prazo de ajustes fiscais feitos por 15 países desenvolvidos, no período
1980/2009: Alemanha, Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Espanha, Estados
Unidos, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Japão, Portugal, Reino Unido e
Suécia. Na maioria dos casos, o
equilíbrio das contas deu-se com base em corte de gastos, ao invés de aumento
de impostos.
No geral,
independentemente do tipo de ajuste fiscal (corte de gastos ou aumento de
impostos), observa-se, no horizonte de dois anos, que o PIB sofre uma pequena
retração. Entretanto, para compensar o efeito contracionista, a taxa real de
juros cai e o câmbio deprecia-se, reduzindo o impacto sobre o consumo e o
investimento e aumentando as exportações líquidas.
Porém, no longo prazo, segundo o estudo, uma redução de 10
pontos percentuais na relação dívida/PIB eleva o crescimento potencial da
economia em 1,4 ponto percentual ao ano. Além disso, se existe a percepção de
que o país possui um risco de default elevado, o ajuste fiscal pode ser ainda
menos custoso para a sociedade em relação à queda do PIB (e aumento de
desemprego), ou ainda, o resultado pode ser até positivo já no curto prazo,
como nos casos clássicos da Irlanda (1987) e da Dinamarca (1983). Tal fato
ocorre devido ao aumento da confiança dos agentes sobre a sustentabilidade
fiscal da dívida pública. Retomam-se o consumo e os investimentos e, assim,
destrava-se a economia.
O caso brasileiro é mais complicado: o País atravessa não
apenas uma crise econômica, mas também política. Por isso, o governo vê-se
incapacitado de aprovar as medidas a que se propôs para resolver o problema
fiscal. Além disso, grande parte do ajuste que propôs baseia-se no aumento de
impostos, como a recriação da CPMF, ao invés do corte de gastos. Deve-se
salientar que o setor público brasileiro tem buscado recorrentemente resolver
seu problema fiscal principalmente com mais tributos. Segundo dados do IBGE e
da Receita Federal, a carga tributária no Brasil saltou de 26% do PIB, em 1995,
para 33,5%, em 2014. Tal fato mostra o porquê da sociedade brasileira não
querer que o governo recorra novamente a esse tipo de solução.
Entretanto, os resultados mais interessantes do estudo do
FMI referem-se às diferenças que ocorrem devido ao tipo de ajuste fiscal, ou
seja, se este ocorre via corte de gastos ou aumento de impostos. Segundo o
relatório, o aumento da carga tributária é o caminho mais “doloroso” para se
resolver o problema. A tabela abaixo apresenta os efeitos estimados para um
horizonte de dois anos para um ajuste fiscal da mesma magnitude, de um ponto
percentual do PIB, a depender se feito com base em aumento de impostos ou corte
de gastos:
O estudo sugere que a diferença dos efeitos deve-se à reação
da política monetária ao ajuste fiscal. Quando o governo aumenta impostos,
especialmente indiretos, isto pode elevar a inflação e fazer o Banco Central
agir de maneira mais tímida para contrabalançar o efeito contracionista do
ajuste fiscal. Assim, os juros caem menos do que deveriam (ou até sobem) e a
taxa de câmbio deprecia-se menos.
Portanto, diante do quadro econômico pelo qual passamos, do
nosso histórico de resolver os problemas fiscais principalmente com aumento de
impostos e dos resultados de alguns estudos, como este do FMI, está na hora de
o governo e o Congresso Nacional finalmente buscarem resolver esse problema de
modo rápido e menos custoso para a sociedade brasileira. Para isso, seriam
decisivas reformas que reduzam os gastos da União, para garantir a
sustentabilidade da dívida pública no longo prazo e, assim, fazer o País voltar
a trilhar o caminho do crescimento econômico e da geração de empregos e
oportunidades para todos. Mais do mesmo tornou-se inútil, pois já se esgotou a
capacidade dos setores produtivos e da sociedade de transferir dinheiro para o
Estado!
**João Guilherme Sabino Ometto é engenheiro (Escola de
Engenharia de São Carlos - EESC/USP), é vice-presidente do Conselho de
Administração do Grupo São Martinho, vice-presidente da FIESP e coordenador do
Comitê de Mudança do Clima da entidade
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